O Crucifixo crucificado

A retirada dos crucifixos é uma polémica escusada e até certo ponto ridícula. A nossa Constituição estabelece a separação entre a Igreja o Estado, pelo que, como católico, a não existência de crucifixos nas salas de aula é coisa que não me preocupa de sobremaneira. Já quanto ao modo como tudo isto começou parece-me tenho mais dúvidas e muitas reticências. Mas estas dúvidas não são só minhas.

Na Grande Reportagem de ontem (sem link), José Manuel Barata-Feyo, dificilmente um direitista, também tem dúvidas sobre o assunto.
Segundo o Diário de Notícias, a ministra Lurdes Rodrigues tomou esta medida a pedido da Associação República e Laicidade (ARL). [...]
Também entendo que a ARL cante uma «vitória do bomsenso», com a qual «ganhamos todos». A associação não tem de ter responsabilidades políticas. Em contrapartida, já me custa a compreender que a ministra não perceba que se trata de uma vitória do mau senso, uma vitória de Pirro, com a qual perdemos todos. Ou, pior ainda, que até o tenha percebido, mas que não tenha tido coragem de dizer «não» ao pedido da ARL (como sugere o facto de a ordem não ter sido dada numa circular dirigida às escolas públicas, mas sim através de um ofício - espécie de circular semiclandestina - enviado às direcções regionais de educação, legitimando que se questione o bom fundamento e, até, a boa consciência da decisão).
[...] a ministra reagiu politicamente à denúncia de uma associação que, em nome do respeito devido a um princípio constitucional, «perquisicionou» Portugal em cata de símbolos religiosos, independentemente da sua exibição originar qualquer tensão social, cultural ou religiosa nas escolas públicas. Igual diligência se espera do Governo perante a clara violação dos preceitos constitucionais que garantemm trabalho e habitação a todos os portugueses. [...]
A segunda evidência é que a ministra não está a prevenir um problema do género que se colocou em França em relação ao véu islâmico, nem sequer a criar um precedente para legitimar a sua futura proibição. [...] Antes pelo contrário, a ministra é que acaba de criar um problema lá onde ele não existia, ao transpor para a realidade nacional um conflito virtual, abstracto e artificial. A cruz, símbolo do cristianismo, não constituía uma ameaça para ninguém, enquanto a sua retirada, «por ofício», vai inevitavelmente cristalizar as atenções e, bem provavelmente, ameaçar a tranquilidade nas escolas - a mesma que a ministra queria acautelar, ao que parece! Temo que renegar o que fomos, para podermos ser o que a ministra acha que somos...
Esta mania de querer vergar a realidade aos ditames ideológicos remete para o cerne da questão porque é típica dos socialistas. [...] O que está errado? Os crucifixos nas escolas ou os 84% dos filhos de imigrante que não se sentem excluídos? São os jovens, é claro, porque os socialistas têm por eles o sentido da História. E se a História não lhes der razão, é a História que está errada... Francamente, deixemos de baixar as calças. Ámen.

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