Miser Europa II

A Comissão Europeia contra o Racismo e a Intolerância (ECRI) divulgou ontem o seu 3.º relatório sobre a situação dinamarquesa, como se sabe esse país do norte da Europa onde não se respeitam os direitos humanos...

Não o li integralmente, mas houve alguns pontos que me saltaram à vista. Por exemplo:
Antisemitism

85. ECRI deeply regrets the fact that Holocaust denial and revisionism are not a crime in Denmark. It has thus been brought to its attention that 90% of Nazi material and memorabilia as well as Holocaust denial material are published and manufactured in Denmark and sold in the rest of Europe, mainly in Russia. ECRI also notes with concern that as freedom of speech prevails in Denmark, antisemitic statements are not monitored. It has further been informed that although there are approximately 5000-6000 Jews in Denmark, very little research is carried out regarding their situation. As a positive matter, ECRI notes that since 2003, each year the Holocaust Memorial Day is commemorated in Denmark on the 27th of January.

Toda a gente que me lê sabe da minha simpatia por Israel e pelos judeus, tendo até já sido acusado de "sionista" (seja lá o que queriam dizer com isso). Mas, longe de mim defender que se deva criminalizar quem nega o Holocausto ou defenda concepções históricas revisionistas sobre este assunto. Agora, vem um organismo do Conselho da Europa defender o crime de opinião? Os negacionistas e revisionistas combatem-se pela exposição das suas mentiras.

Mais grave é a esta afirmação: "ECRI also notes with concern that as freedom of speech prevails in Denmark...". Mas que é isto? Então não é suposto a liberdade de expressão prevalecer. Já os gregos antigos, juntamente com a isonomia (igualdade de direitos) e a isocracia (igualdade no poder), gabavam-se de possuir a isegoria (igualdade no falar), ou seja, a nossa liberdade de expressão. Quem conhecer as comédias de Aristófanes sabe que ele utiliza uma liberdade ilimitada para atacar políticos, militares, filósofos ou poetas, mesmo no contexto da Guerra do Peloponeso. Como diz Ribeiro Ferreira in A democracia na Grécia Antiga (1990:175): "nenhuma democracia moderna, por mais aberta que seja, concede uma liberdade de expressão tão ampla como a que se vivia em Atenas."

A tentativas censórias do politicamente correcto são por demais evidentes. Além do mais, quem é que declara o que se pode dizer e o que não se pode dizer? Se a propaganda nazi é proíbida, porque não é proíbida também a propaganda comunista? O comunismo também matou milhões de pessoas (e ainda continua a matar)... Estas ideias erradas combatem-se no campo das ideias.

Outro ponto que me levanta grandes dúvidas quanto à seriedade e utilidade de um organismo como este, é o que diz respeito ao ponto dos "Vunerable groups" em que os muçulmanos vêm logo em primeiro lugar.

Continuando o seu ataque à liberdade de expressão, o relatório diz (destaques meus):

Although, in 2003, a number of cases of incitement to racial hatred in general, and against Muslims in particular were successfully prosecuted, ECRI notes that the police are generally reluctant to investigate complaints made by Muslims concerning hate speech directed against them. ECRI regrets in this regard that the lack of a strong message that would be sent by consistently prosecuting those who breach Article 266 b) of the Criminal Code has given some politicians free reign to create an atmosphere of suspicion and hatred towards Muslims. This problem is compounded by the fact that the media mostly interview those imams who express the most extreme views, thus confirming the image that is being given of Muslims as a threat to Danish society. In September 2005, with the stated intention of verifying whether freedom of speech is respected in Denmark, a widely-read Danish newspaper called on cartoonists to send in caricatures of the Prophet Mohammad; such drawings are considered to be offensive by many Muslims. This newspaper thus published 12 such cartoons, one of which portrayed the Prophet as a terrorist. The issue has caused widespread condemnation and a protest march was organised in Copenhagen as a result. The fact that, according to a survey carried out regarding the publication of these drawings, 56% of the respondents felt that it was acceptable is a testimony of the current climate in Denmark. ECRI considers that the goal of opening a democratic debate on freedom of speech should be met without resorting to provocative acts that can only predictably elicit an emotional reaction. ECRI wishes to bring to the Danish Government’s attention in this regard, that in its General Policy Recommendation No. 5 on combating intolerance and discrimination against Muslims, it calls on Member States to encourage debate within the media on the image which they convey of Islam and Muslim communities and on their responsibility in this respect in avoiding the perpetuation of prejudice and biased information.
Este parágrafo é um rematado disparate e ainda se criticam os dinamarqueses por 56% destes acharem que a publicação das caricaturas de Maomé como acto perfeitamente legítimo. Só por isso os muçulmanos são considerados como "oprimidos" nas Dinamarca. mas ainda maior disparate vem, aseguir, nas recomendações (destaques meus):
Recommendations :

92. ECRI urges the Danish Government to send a strong signal that incitement to racial hatred against Muslims will not be tolerated, by strengthening Article 266 b) of the Criminal Code to that end.
"Racial hatred" contra muçulmanos? Desde quando ser muçulmano é uma raça? Idiotice pura.Ainda se lá estivesse escrito "religious hatred". Se calhar querem fazer equivaler "racial hatred" a "racial and religious hatred". Mas as palavras ainda têm o seu sentido. "Islamofobia" também não é o equivalente muçulmano de "anti-semitismo", por mais que os promotores da noção de "islamofobia" se esforcem. É que se referem as realidades bem diferentes.

Sob a rubrica "Specific issues - Climate of opinion", os burocratas europeus voltam a atacar a sua "bête noire": a liberdade de expressão (destaques meus).
104. ECRI notes with deep concern that, as indicated above, the climate in Denmark has worsened since its second report and that there is a pervasive atmosphere of intolerance and xenophobia against refugees, asylum seekers, as well as minority groups in general and Muslims in particular. The media, together with politicians play a major role in creating this atmosphere. As also previously indicated, members of the Danish People’s Party, have, on several occasions, made shockingly racist statements in the media, without being suspended from this party. The police’s reluctance to bring charges against those who incite racial hatred in accordance with Article 266 b) of the Criminal Code and the fact that freedom of expression is placed above all else have contributed to giving free reign to some politicians to make derogatory statements in the media about minority groups.
Verdadeiramente criminosos estes dinamarqueses com a sua casmurrice em privilegiar a liberdade de expressão. Não há dúvida, em cada burocrata mora um censor.

Enfim, a conversa já vai longa, mas esta gente não tem mais que fazer? Certamente que a Dinamarca terá problemas com a integração dos seus imigrantes. Mas, pôr o ónus apenas no governo e líderes políticos não será a receita para o desastre? Será que os imigrantes nada têm que fazer para se integrarem na sociedade que os recebe e que lhes dá melhores condições do que os seus paíse de origem.

Como é que os dinamarqueses, por exemplo, podem ter opiniões boas sobre os muçulmanos quando vêem casos como este. Se ficaram a saber que quem inflamou o caso das caricaturas foi um imã que vive na Dinamarca há mais de vinte anos e que se recusa a aprender dinamarquês. Em que poucas vezes se ouve a voz dos chamados muçulmanos moderados (que certamente existem), seja por medo, seja por outra razão qualquer? Em que as mais importantes autoridades religiosas muçulmanas na Europa têm muita dificuldade em condenar actos terroristas cometidos por extremistas muçulmanos?

Post-scriptum. O primeiro-ministro da Dinamarca já disse para onde vai arquivar este relatório: o cesto de papéis.

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